Segmento quer que projeto passe por três comissões antes de ir a plenário; decisão depende de Pacheco
Entidades civis do campo progressista estão se mobilizando para tentar barrar a possibilidade de o chamado “PL do Veneno” obter uma tramitação acelerada no Senado. Organizações de defesa do meio ambiente buscam garantir a aprovação de requerimentos que pedem para que a proposta seja analisada ainda pelas Comissões de Assuntos Sociais (CAS), Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e de Meio Ambiente (CMA). O método seria uma forma de aprofundar e detalhar o debate e, além disso, de retardar a possível votação em plenário, última instância de votação.
A proposta, que tramita atualmente como Projeto de Lei (PL) 1.459/2022, foi aprovada em dezembro pela Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) e saiu do colegiado já com tramitação de urgência aprovada. Com a virada da legislatura, o trâmite amorteceu e, mais recentemente, no final de abril, o PL foi alvo de um boato nos bastidores do Senado de que lideranças ruralistas estariam se articulando para agilizar a votação em plenário. Ainda sem confirmação oficial na página de tramitação do PL, a informação deixou as entidades civis em alerta.
O segmento teme que a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), nome formal da bancada ruralista, alcance esse objetivo em breve. Por essa razão, organizações como a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), o Greenpeace e a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida fizeram um “tuitaço” na quarta (3) para tentar mobilizar internautas contra a medida. Um grupo de representantes desta articulação também se reuniu na mesma data, no Palácio do Planalto, com interlocutores da Secretaria de Relações Institucionais (SRI) e da Secretaria-Geral da Presidência da República (SGP).
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O objetivo do encontro foi pedir o apoio do governo na luta contra o PL em termos de articulação da base. O presidente da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), que participou da reunião, disse ao Brasil de Fato que o campo progressista espera contar tanto com o apoio da gestão no sentido de evitar uma votação da proposta no plenário quanto no sentido de buscar uma costura com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tentar convencê-lo a acatar os requerimentos que pedem a análise do PL nas demais comissões.
Segundo Tatto, durante o encontro o governo informou que trabalha na formatação de uma nota técnica que será utilizada pelo Planalto como referência para tentar nortear a postura da base. “Todos já sabem e a ciência já tem demonstrado os impactos que esse PL tem para a saúde. Isso é uma preocupação do ponto de vista da defesa da vida, do impacto que tem para a mortandade de animais. Nunca se dimensionou a quantidade de animais silvestres que morrem por causa do só de agrotóxicos, por exemplo. [Tem ainda] a contaminação do solo, a desertificação, a contaminação dos mananciais”, exemplifica o parlamentar, ao citar algumas das preocupações com o conteúdo do projeto.
Preocupação semelhante tem a assessora de Políticas Públicas do Greenpeace, Luiza Lima. Na quarta (3), a entidade fez um protocolo formal dirigido a Pacheco pedindo que a proposta não entre em votação no Senado. No documento, a organização chama a atenção, por exemplo, para o relatório “Acordo UE-Mercosul: um coquetel tóxico’’, que mostra impactos considerados alarmantes da utilização de pesticidas por parte de países do Mercado Comum do Sul (Mercosul).
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“Assim como o acordo UE-Mercosul, a organização alerta que quaisquer medidas que venham a facilitar o registro e o uso de mais substâncias sem critérios robustos representam um grave risco para a geração atual e as futuras e que esse é exatamente o caso do PL 1459/2022”, cita o Greenpeace, em nota enviada à imprensa. Luiza Lima lembra que, em março de 2022, na realização do chamado “Ato pela Terra”, em Brasília (DF), o presidente do Senado prometeu que teria “toda a cautela” com projetos que pudessem prejudicar o meio ambiente.
“Eu acho que agora é uma ótima oportunidade que ele tem de cumprir com a promessa dele e fazer essa revisão de despacho, colocar pra outras comissões e fazer com que esse PL não seja votado em plenário como requerimento de urgência, como os ruralistas têm forçado tanto para que aconteça.”
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A assessora destaca que o Greenpeace não vê aspectos passíveis de negociação no texto. “É que esse PL não traz ganho nenhum para a sociedade. Pelo contrário, só traz retrocessos ao modificar a legislação vigente de forma a acabar com a proteção para a aprovação devida dos novos agrotóxicos no país, deixando aí muita insegurança para a população no uso desses agrotóxicos”, argumenta. De modo geral, esse é o posicionamento de todas as entidades progressistas que bradam contra o PL 1459.
Histórico
A proposta tramita no Congresso desde 1999, quando surgiu na forma de Projeto de Lei do Senado (PLS) n° 526, tendo sido apresentada pelo então senador ruralista Blairo Maggi (sem partido-MT). De modo geral, parlamentares ligados à FPA argumentam que o PL seria uma forma de modernizar e agilizar o processo de liberação de venenos. Por outro lado, o texto é considerado por especialistas das áreas de saúde e meio ambiente como um retrocesso na legislação referente aos pesticidas porque flexibiliza as normas de aprovação e venda de agrotóxicos. Tais produtos são conhecidos por contaminarem o lençol freático, o meio ambiente e causarem danos à saúde.
O texto reduz o papel regulatório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), um dos pontos mais controversos da proposta. Por essa e por outras razões, os críticos do PL argumentam que uma eventual aprovação da medida deixaria o Brasil na retaguarda do mundo, uma vez que países mais desenvolvidos estipulam limites mais rígidos para venenos considerados mais danosos.
Alternativa
Por considerarem o projeto muito danoso ao meio ambiente, os representantes da sociedade civil que se reuniram com o governo na quarta discutiram também a possibilidade de ser apresentado um PL alternativo à proposta defendida pelos ruralistas. A militante Juliana Acosta, da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, explica que a campanha não é contrária à ideia de uma norma que modifique a legislação que trata de agrotóxicos. Mas o que o segmento defende é um texto que aprimore o papel de regulação e fiscalização do Estado e garanta medidas mais protetivas para a saúde e o meio ambiente.
“Há também uma inclinação de certos mediadores do governo de que a gente precisa encontrar um caminho do meio, e a gente entende que o caminho não é negociar esse texto. Não é negociar a supressão de alguns pontos que estão nessa matéria. Negociar esse texto não adianta. Não é bom para a gente, não é bom para a sociedade civil, para os movimentos sociais e também não é bom para o governo, que já declarou que é contra os agrotóxicos”, afirma.
“É porque nós entendemos que, se a gente ficar só no enfrentamento ao ‘PL do Veneno’,uma hora esse PL, que não tem como remendar, pode ser aprovado. Como a conjuntura é ruim, a gente tem dificuldade de avançar no PL do Pnara [Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, detalhada no PL nº 6.670/2016] por conta do cenário aqui no Congresso, então, entendo que o governo deverá puxar para si a responsabilidade e tentar construir alternativa. Nós entendemos que esse PL não é bom nem para o agronegócio”, emenda Nilto Tatto.
Fonte: Brasil de Fato
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